22 janeiro 2007

Gelson Luiz: artista plástico retrata

Já faz muito tempo que o menino Gelson fitava a paisagem urbana da janela do apartamento de Copacabana onde sua mãe trabalhava como empregada doméstica. Os olhos bisbilhoteiros se fixavam nos números pintados sobre os ônibus, nas formas e cores dos coletivos, que lhe pareciam o componente mais encantador daquela vista.

Em casa, buscava fotos dos coletivos em jornais e revistas, para recortá-las e colá-las em papelão. Dessa forma, construía suas “cidades”, dando asas (ou seriam rodas?) à imaginação fértil de criança. A cidade grande, com suas cores e ângulos, seus contrastes sociais expostos nas paredes grafitadas sempre foram um atrativo para Gelson. Hoje, aos 42, transformada em arte, a paisagem urbana quase grita em cores de suas telas, muitas delas premiadas.




O artista
Nascido em Saracuruna, município de Duque de Caxias (RJ), Gelson Luiz da Silva foi laminador de lã de vidro e apontador de construção civil. Até que a crise por que passou este setor deixou-o sem emprego. A arte, que ocupava apenas as horas vagas, passou a ser meio de vida, ganhou todos os horários do seu dia – que começa às 10h e só termina às 4h da manhã seguinte.

Um curso na Colméia de Pintores do Brasil, no Jardim Zoológico do Rio, em 1981, deixou-o um tanto frustrado, um tanto feliz e muito surpreso. Buscava aprender técnicas acadêmicas, mas foi aconselhado pelo professor: “continua trabalhando assim, que está bom.” Ele mal tinha segurança de manejar o pincel, mas seguiu o conselho. Ao representar uma paisagem do Jardim Botânico, achou que as palmeiras mereciam destaque. Acostumado ao uso do plastic, a ele recorreu para fazer sobressair os troncos. Ao acabar a obra, ela foi imediatamente adquirida por um visitante da Colméia. Este foi um grande incentivo para o espantado Gelson, que quase não acreditava no que acontecia. De lá para cá, passou a usar cada vez mais o relevo nas placas de eucatex pintadas a óleo, começou a freqüentar feiras de artesanato, foi convidado para exposições, ganhou algumas medalhas.

As obras
Apesar de todas as dificuldades a que está sujeito qualquer artista que, no Brasil, pretenda viver de sua arte, Gelson vem conseguindo esta proeza. Utilizando técnica mista e pintura a óleo sobre eucatex, consegue forte expressividade, através do relevo e das cores. Retrata cenas do cotidiano e se reporta muito ao passado próximo. Suas ruas mostram muros cobertos por inscrições que situam o apreciador numa determinada época. Os modelos de veículos, sempre presentes, completam o trabalho de situação geográfico-temporal. Gelson é um cronista do seu tempo. Algumas de suas obras estiveram em exposição na Noruega até 5 de novembro deste ano, e de lá devem seguir para participarem de mostra na Alemanha. Ele teve telas premiadas no Salão de Pintura da Coléia de Pintores do Brasil (1984); no II Salão do Clube dos Sargentos e Oficiais do Rio de Janeiro (1995), no I Salão da Primavera e no I Salão de Inverno do Centro Cultural Joaquim Lavoura (ambos em 2000); no Salão do Comando Militar do Leste (2001). Este ano, participou de mostra no MAC com “2002 Niterói Arte Hoje” (depois estendida para o Teatro João Theotonio, Centro Cultural Cândido Mendes); de coletiva da Regional Metropolitana (Casa das Artes), e teve sua primeira individual, na Sala José Cândido de Carvalho, em São Gonçalo (RJ).

O traço característico é o mesmo dos primeiros desenhos, feitos por volta dos 7 anos: a cidade e o transporte coletivo – algumas mostram o transporte ferroviário, mas a maioria traz imagens de ônibus. Ao conceder entrevista para esta revista, Gelson só fez um pedido: o de poder registrar seu reconhecimento ao pessoal da Associbus, entidade informal que, no Rio de Janeiro, reúne colecionadores de material referente ao transporte por ônibus, pelo incentivo que vem recebendo, especialmente de Rafael Avelar e Rodrigo Santiago. O recado está dado.

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